Tese doutoral

Bases epistemológicas dos discursos dominantes de internacionalização da educação superior no Brasil

Fernanda Leal
Programa de Pós-Graduação em Administração
Universidade do Estado de Santa Catarina, 2020

Resumo:

Em tempos de reconfiguração das funções exercidas pela educação superior no mundo, esforços direcionados aquilo que convencionou-se chamar de ‘internacionalização’ se intensificam e se manifestam nos discursos como imperativo; como caminho para que os sistemas educacionais, as instituições universitárias e os indivíduos respondam aos desafios da ‘economia global do conhecimento’. Esta tese, desenvolvida com as lentes epistemológicas da Modernidade/(De)colonialidade, resulta de um esforço para contribuir com uma emergente área de estudos críticos em internacionalização da educação superior, que problematiza a natureza técnica, apolítica e a-histórica das abordagens convencionais. A proposição de que a ideia de internacionalização enfatizada pelos discursos político e acadêmico dominantes encontra-se imersa na matriz cultural do poder colonial e avança sob o alicerce de um imaginário global que reforça geografias desiguais de poder, de saber e de ser, induziu à definição do objetivo geral: compreender as bases epistemológicas dos discursos dominantes de internacionalização da educação superior no Brasil. O lócus de interesse da pesquisa foi o Brasil e, particularmente, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O percurso metodológico, de natureza qualitativa, contemplou a revisão da literatura sobre o fenômeno; a participação em eventos no ‘Sul’ e no ‘Norte’, sobretudo da Asociación de Universidades Grupo Montevideo (AUGM) e do Center for International Higher Education (CIHE), Boston College; bem como uma pesquisa de campo na UFSC, estendida à Associação Brasileira de Educação Internacional (Faubai) e ao Programa Institucional de Internacionalização (Capes-PrInt). Os dados foram obtidos por meio de observações diretas, entrevistas e recursos documentais e bibliográficos, e analisados com base em princípios da Análise Crítica do Discurso. Envolveu, ainda, a contextualização de atores com alto poder discursivo nos rumos da ‘internacionalização’ da UFSC, o que revelou a existência de uma narrativa hegemônica, de ordem política e acadêmica, em torno do que significa ‘internacionalizar’. Cinco dimensões – 1. ‘Internacionalização’ como imperativo e bem incondicional; 2. ‘Internacionalização’ como objeto resultante de determinações exteriores; 3. “Exclusivamente in English, of course”; 4. ‘Internacionalização’ como meio para a condição concorrencial generalizada; e 5. ‘Internacionalização’ como meio para a difusão de retóricas modernas/coloniais – possibilitaram sustentar que: 1. Discursos e estratégias de ‘internacionalização’ nos contextos em evidência, à medida que não contemplam a complexidade da universidade pública brasileira e das relações internacionais desigualmente constituídas ao longo da história, são altamente funcionais ao avanço do capitalismo universitário/acadêmico global em curso. Nesse sentido, apresentam-se como reflexo de um projeto moderno/colonial que, em seu atual estágio, requer a transformação da instituição universitária em organização exclusivamente ditada pela racionalidade econômica/instrumental; 2. Uma das bases em que essa lógica colonial se ampara é nos pressupostos estruturais da literatura funcionalista sobre o tema, que neutraliza tensões e contradições do fenômeno e a estabelece zonas de ‘não ser’ ao universalizar o que é situado; 3. Desnaturalizar a ideia dominante de ‘internacionalização’ – no sentido de possibilitar a concepção de outras formas de fazer, pensar, vivenciar e ser nas relações internacionais e interculturais universitárias/acadêmicas – implica em distanciar-se dos discursos político e acadêmico contemporaneamente enfatizados sobre o fenômeno e amplamente adotados por instituições e atores envolvidos com a educação superior; 4. A epistemologia decolonial, os conceitos de ‘epistemologias do Sul’ e ‘redução sociológica’, o legado do Movimento de Córdoba e as lutas pela democratização da universidade pública fornecem pistas para ‘habitar a fronteira’ e pensar em outras internacionalizações da educação superior no Brasil, que, em referência a Frantz Fanon, se associam a uma agenda de ‘total desordem’.

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